05 novembro 2005

O Sr. Assunção

Teve mesmo azar, o Sr. Assunção. Para quem não conhece, o Sr. Assunção foi o homem mais simpático e mais prestável que algum dia passou por estas bandas. Viveu aqui muitos anos, e nunca ninguém conseguiu arranjar a menor queixa para lhe apontar, por muito que se esforçasse. É que o Sr. Assunção não existe. Quer dizer, era um homem como não há outro, dedicado a toda a gente. Bastava imaginar que alguém tinha um problema, e logo o Sr. Assunção aparecia com a solução para o caso. Às vezes nem a própria pessoa sabia que tinha o problema e já o Sr. Assunção lhe trazia a cura para o mal, porque ao Sr. Assunção nada escapava. Por exemplo, se numa festa um cavalheiro se apresentasse descomposto com um cabelo na lapela do casaco, antes que alguém visse já o Sr. Assunção tinha delicadamente tirado o cabelo e endireitado a lapela. Ou se durante um jantar uma senhora se estivesse a engasgar, o Sr. Assunção, com todo o cuidado e depois de pedir licença, dava-lhe as três palmadinhas nas costas e a senhora já não chegava a tossir. Era assim, o Sr. Assunção. Um dia, saiu vestido de luto logo de manhãzinha e perguntaram-lhe Quem morreu, Sr. Assunção? e ele disse Foi o Zé Bento Careca, e toda a gente se riu porque o Zé Bento Careca estava ali mesmo em frente muito vivo. Mas o Zé Bento Careca não riu e morreu, e realmente viu-se logo que o Sr. Assunção era o único que estava preparado para o funeral. Estava sempre pronto a ajudar, o Sr. Assunção, por isso a culpa não foi dele. A culpa foi do pobre Octávio, o próprio, que não se conseguiu calar. Já devia saber como era o Sr. Assunção, mas pelos vistos nunca tinha reparado ou então fez de propósito. Seja como for, o pobre Octávio é que fez mal. Quando o Sr. Assunção lhe perguntou Como vai Sr. Octávio?, o próprio Octávio devia ter dito apenas Bem Obrigado e o Sr?. Mas não. Não disse que estava bem, e queixou-se do mal com requintes de precisão: Esta noite não preguei olho. O Sr. Assunção pregou-lho, não merecia ser preso.