O Rei
Houve em tempos em Kara-Ob um rei de grandes riquezas e majestades que gostava de ser rei. Um dia, para ser mais rei que todos os reis do mundo, mandou que toda a cidade fosse forrada a espelhos. Assim foi feito. Contente andava o rei, que em cada saída real ao jardim podia admirar-se em trinta, ou quarenta, ou cem gravuras de si. Mas apenas o rei sabia gozar o esplendor da obra, porque os espelhos criaram mil cidades dentro da mesma cidade, com trezentas ruas por cada rua, e oitenta casas por cada casa, e vinte pessoas por cada pessoa. A cidade confundiu-se num labirinto de imagens de imagens de imagens de imagens, até ao infinito maior que o infinito conhece, de tal forma que as pessoas deixaram de saber quem eram, o que eram ou para onde iam, ou os lugares por onde não queriam passar. Um dia, quando o povo reflectido já quase estava louco de tanto se procurar, chegou à cidade um velho mendigo andrajoso e cansado, carregado de pó, suor e fome. Porque era cego não se viu nem viu ninguém mas, com a mão, foi procurando os caminhos descritos pelas paredes das casas. Primeiro espantadas, depois menos receosas, uma a uma as pessoas da cidade foram estendendo a mão e descobrindo o tacto para chegar às ruas certas há tanto tempo perdidas. Foi o cego que lhes ensinou de novo quem eram e a cidade que tinham e os sítios por onde andavam. Não admira por isso que, apenas três dias depois, o rei tenha sido deposto, os espelhos quebrados, e o velho mendigo cego, embora cego, proclamado rei.
6 Comments:
Ora aqui está uma obra-prima. Tu és a Lia Christien Andersen. Ou serás a Lia Grimm?
Qualquer que seja, adoro! Porém, pergunto: o que aconteceu ao "quem tem olho é rei"?
Bjs
Bolas, Jigoku!... se eu fosse rapariga para corar agora tinha ficado que nem um morango! Obrigada, mas exageras muito.
... acho que o "quem tem olho é rei" continua demasiado bem de saúde, ainda para mais agora que se faz acompanhar pelo "quem mais cegos faz mais rei é".
Beijos muitos, Monstro!
...afinal não sou só eu...
Modesta do caraças! Não córes; sorri de satisfação, tá bem?
Beijos e parabéns; muitos de ambos!
É verdade, Lia, parabéns!
Esse é mesmo um conto à maneira, com final feliz e tudo!
É pena que na realidade as pessoas não tenham a decência de valorizar quem as tira da merda (não há problemas num palavãozito, pois não?...) e, antes pelo contrário, têm a mania de cuspir nesses "salvadores"...
Eu não coro! Mas fico atrapalhada... acho que parabéns é coisa que só se dá a quem merece, e sinto que não tenho mérito nenhum em despejar para o papel imagens que me surgem não sei de onde...
Beijos muitos para todos
Se ficas atrapalhada é outra coisa! Retiro de imediato os parabéns...
Enviar um comentário
<< Home